
Nos cantos mais virais das redes sociais, uma nova expressão captura o estado de espírito de uma geração exausta: “bed rotting” (literalmente, “apodrecer na cama”). O termo descreve o ato deliberado de passar horas, ou até o dia inteiro, na cama, sem a obrigação de fazer absolutamente nada produtivo. Para muitos na Geração Z, é um ato de rebelião, um merecido contraponto à pressão incessante da “cultura da produtividade” que dita que cada momento do dia deve ser otimizado. É o autocuidado em sua forma mais passiva e, para alguns, mais necessária.
Contudo, enquanto a tendência ganha adeptos que a defendem como uma forma legítima de recarregar as energias em um mundo caótico, psicólogos e especialistas em saúde mental levantam uma sobrancelha de preocupação. Eles apontam para uma linha tênue e perigosa entre um descanso restaurador e um sintoma clássico de problemas de saúde mental, como a depressão e a ansiedade. A questão central que emerge é: o “bed rotting” é uma escolha consciente de autocuidado ou um sinal de que a cama se tornou mais um cativeiro do que um refúgio?
A Cama Como Refúgio: Uma Resposta ao Burnout
Para entender o apelo do “bed rotting”, é preciso olhar para o contexto em que a Geração Z amadureceu. Criados em meio a crises econômicas, instabilidade climática, uma pandemia global e a pressão constante das redes sociais, o esgotamento é quase um estado padrão. O “bed rotting” surge como um antídoto radical a essa realidade. É a permissão para se desligar, para não performar, para simplesmente existir sem as demandas do mundo exterior. A cama se torna um casulo, um espaço seguro onde as expectativas não podem alcançá-los.
Nessa perspectiva, a prática não é sinal de preguiça, mas de autopreservação. É o reconhecimento de que a bateria social e mental chegou ao fim e precisa ser recarregada da forma mais completa possível. Para uma geração que sente que precisa justificar cada momento de descanso, “apodrecer na cama” é uma forma de reivindicar o direito ao ócio sem culpa. É uma pausa radical do bombardeio de informações e da obrigação de ser interessante, produtivo ou feliz o tempo todo.
Quando o “Autocuidado” Mascara a Depressão: Os Sinais de Alerta
Aqui é onde a discussão se torna crítica. Especialistas fazem uma distinção crucial entre escolher descansar e sentir-se incapaz de fazer qualquer outra coisa. O descanso intencional rejuvenesce; a inércia forçada pela depressão drena a vida. A depressão clínica frequentemente se manifesta através de sintomas como avolição (uma severa falta de motivação para iniciar ou concluir tarefas) e anedonia (a incapacidade de sentir prazer em atividades que antes eram prazerosas). Ficar na cama o dia todo pode ser a expressão mais visível desses sintomas.
Os sinais de alerta de que o “bed rotting” cruzou a linha do autocuidado para um problema de saúde mental são claros. Se a permanência na cama não é uma escolha prazerosa, mas sim ditada por uma sensação de peso e incapacidade de se levantar; se é acompanhada por sentimentos de desesperança, tristeza profunda ou apatia; se leva à negligência da higiene pessoal, das responsabilidades e ao isolamento social contínuo, então não se trata mais de uma tendência, mas de um pedido de ajuda.

O Impacto Físico do Sedentarismo Prolongado
Mesmo que o “bed rotting” não esteja ligado à depressão, a prática regular não é isenta de consequências físicas e mentais. O corpo humano não foi feito para permanecer deitado por períodos tão extensos. Ficar na cama o dia todo pode levar a uma série de problemas, como dores nas costas e no pescoço, rigidez muscular e uma queda no metabolismo. A falta de exposição à luz solar também pode desregular o nosso relógio biológico, tornando mais difícil adormecer à noite e gerando um ciclo de sono de má qualidade.
Mentalmente, a falta de estímulos e de movimento pode contribuir para a chamada “névoa cerebral”, uma sensação de lentidão cognitiva, dificuldade de concentração e falta de clareza. O que começa como uma tentativa de aliviar o estresse mental pode, ironicamente, acabar por exacerbar a letargia e a sensação de estagnação. O descanso é vital, mas a inatividade prolongada pode ter o efeito oposto ao desejado, deixando a pessoa ainda mais cansada e desmotivada.
Conclusão
O fenômeno do “bed rotting” é um retrato complexo do nosso tempo. Ele reflete, por um lado, o grito de uma geração por descanso e por uma vida menos pautada pela produtividade a qualquer custo. É uma crítica válida a uma cultura de burnout que normalizou a exaustão. Por outro lado, ele carrega o risco de normalizar um comportamento que pode ser um sintoma incapacitante de depressão ou de outros transtornos mentais, mascarando a necessidade de ajuda profissional sob o rótulo de “autocuidado.
A chave para navegar essa tendência é a autoconsciência honesta. É essencial se perguntar: “Eu estou escolhendo isso para me recarregar, ou estou fazendo isso porque sinto que não consigo fazer mais nada?”. Se a cama se tornou o único lugar onde o mundo parece suportável, se o descanso se transformou em fuga, esse é o sinal mais claro de que o problema é mais profundo do que o cansaço. O verdadeiro autocuidado, às vezes, não é ficar na cama, mas sim encontrar a força para sair dela e pedir ajuda.

Sobre o Autor
Escritora e pesquisadora da saúde mental. Desde sempre, sou fascinada pelo poder das palavras e das pequenas mudanças de perspectiva para transformar o dia a dia. Como uma entusiasta do desenvolvimento pessoal, dedico meu tempo a estudar e compilar ideias que possam trazer inspiração. Busco sempre basear minhas reflexões em fontes diversas confáveis e verificadas para apresentar diferentes perspectivas sobre os temas abordados, com responsabilidade e respeito.


